Chávez unifica polícias para enfrentar criminalidade
CLAUDIA JARDIM
da BBC, em Caracas
Pressionado pelos altos índices de criminalidade, o governo da Venezuela vai promulgar nesta terça-feira o Sistema Nacional de Polícia, resultado de um processo de reforma policial realizado no ano passado que pretende atenuar o principal motivo de preocupação dos venezuelanos: a violência.
O novo sistema prevê a constituição de uma Polícia Nacional "preventiva e humanista", de acordo com o governo, que deverá substituir os corpos de segurança estatais, municipais, federais e de inteligência existentes atualmente.
"É necessário acabar com esse desmembramento da polícia em distintos corpos, uniformes, salários, armas de guerra e procedimentos, como se fôssemos 20 países dentro de um só", disse o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que após perder o referendo de dezembro passado prometeu realizar uma gestão mais eficiente, tendo a segurança como uma de suas prioridades.
De acordo com a nova lei, a Polícia Nacional também deverá assumir características de polícia comunitária e promover a participação dos cidadãos em uma tentativa de reduzir o número de delitos e homicídios.
Insegurança
A demanda não é pouca. De acordo com o instituto de pesquisas Hinterlaces, 79% dos venezuelanos consideram a insegurança o principal problema do país.
Para a oposição, o governo tem sido negligente no combate à criminalidade.
De acordo com um levantamento do Centro para a Paz e Direitos Humanos da Universidade Central da Venezuela, publicado no relatório 2007 do Programa Venezuelano de Educação-Ação em Direitos Humanos (Provea), quando Hugo Chávez venceu as eleições presidenciais, em 1998, o índice de homicídios era de 25 assassinatos por 100 mil habitantes.
Após nove anos de governo, o número subiu para uma média de 45 mortos por 100 mil pessoas em 2007, com cerca de 13 mil assassinatos no mesmo período. No Brasil o índice é de 23 mortos por 100 mil habitantes.
O relatório do Provea gerou controvérsias. O ex-vice-presidente José Vicente Rangel admitiu que a insegurança é um dos problemas enfrentados pelo governo, mas disse não acreditar nos números do Provea.
"Estes números estão superestimados e contam com uma manipulação política. As cifras reais são inferiores", afirmou Rangel à BBC, sem apresentar outros indicadores.
O Ministério de Interior e Justiça anunciou que o número de homicídios foi reduzido em 60% nos últimos meses, a partir da implementação do Plano de Segurança lançado em janeiro, orientado basicamente para a proteção civil.
Pobreza
Para o presidente venezuelano, a violência é conseqüência direta da exclusão social. Mas enquanto o governo anunciava a redução dos índices de pobreza, paralelamente crescia o número de delitos.
A pesquisadora Josbelk González, do Centro para a Paz, afirma que é um erro relacionar o grau de pobreza aos números de criminalidade. "O social é muito importante, mas não podemos esperar que uma intervenção de sucesso no social automaticamente dê como resultado uma diminuição nos índices de criminalidade e homicídios", diz González.
Para a pesquisadora, o aumento dos índices de violência está relacionado com a impunidade e a ausência do Estado como juiz na solução de conflitos.
"A falta do Estado como árbitro nas relações sociais, o acesso precário à Justiça e a impunidade são algumas das causas do crescimento da violência", afirma.
Ausência
Assim como ocorre em favelas do Rio de Janeiro, na periferia de Caracas é comum que após um enfrentamento entre grupos, geralmente ligados à venda de drogas, se estabeleça um toque de recolher.
A polícia na periferia também é malvista, geralmente associada à repressão, e muitas vezes tão temida como a recente presença de grupos de paramilitares, cada vez mais freqüentes nos barrios (favelas), de acordo com o Provea.
"Nossa proteção somos nós mesmos que fazemos, ninguém aqui acredita na Justiça", diz o motoqueiro Anibal Gil, 38, morador do bairro de La Vega, no oeste da capital.
Gil afirma que há anos se transformou no "policial" de sua família. Ele conta que há sete anos um de seus três irmãos foi morto. "Tenho uma arma, não desfilo com ela, mas é preciso ter. No caso de uma emergência temos que sobreviver", diz.
Armas
Atualmente, cerca de 5 milhões de armas de fogo estão distribuídas entre a população venezuelana, das quais apenas 1,5 milhão estão legalizadas.
Josbelk González, do Centro para a Paz, prefere esperar os resultados do novo Sistema Nacional de Polícia para fazer uma avaliação, mas afirma que "a iniciativa não é a solução para o problema, e sim um primeiro passo".
O morador de La Vega vê com cautela a reforma policial. A seu ver, o programa só será eficiente se "cortar o mal pela raiz".
"O governo tem que pagar bem o policial para eliminar a corrupção e treiná-lo psicologicamente para entender que se está lidando com gente", diz Gil.
A outra saída, para Gil, está no social. "É preciso dar educação associada a uma oportunidade digna de trabalho e lazer. Se não, a meninada vai escolher o caminho mais curto para sobreviver."
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